sábado, 28 de março de 2009

Coisas


Pintava a cara. Abria os olhos e teimava pintar de preto o que devia ser vermelho. Enrolava as pestanas e molhava os lábios. Olhava ao espelho e sabia que faltava algo. Vestia-me cuidadosamente. Penteava preguiçosamente, os longos fios dourados. Voltava a ver-me ao espelho mas faltava algo de muito importante. Só mais tarde descobri, em plena batida no coração, brilho ofuscante e um som descomunal nos ouvidos. Faltavam-me esperanças.

Limitei-me a esperar pelo tempo, que teimava a avançar depressa demais. A observar aquilo que a minha sobriedade permitia e a tocar naquilo que não podia. O rumo foi lentamente ganhando forma. Com ele, ganhou forma o desejo pelo proibido e por aquilo que me foi negado. Queria pertencer ao lugar que me tinha sido retirado. O tempo esqueceu-se de mim e eu esqueci-me do tempo. Apaguei as pessoas e desliguei as luzes. Despedi-me da festa mas não me despedi de ti. Não preciso. A despedida já foi feita á muito tempo. O relógio bateu as três da manha como quem bate a meia noite. Perdi as esperanças como quem perde o sapato de cristal. Tive o meu fim triste como quem tem um final feliz.

1 comentário:

  1. É o que eu mais gosto.
    'Tempo de mudar' foi o teu melhor tempo, mudas-te para melhor ;)
    Beijinho

    "Abstenção"

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tremidélaaas